Wellington Farias

A prisão não são as grades; a liberdade não é a rua. Existem homens presos na rua e livres na prisão. É uma questão de consciência." Gandhi

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Local: João Pessoa, Paraíba, Brazil

Leto de "seu" Sales e "dona" Ceiça. Nascido em Serraria, no Brejo da Paraíba, em 1956.

5/11/2006

A entrevista em que Sílvio Pereira detona o PT

LAND ROVER

Land Rover foi devolvido e sonho é ter restaurante ‘Virei um cara do bando dos 40’ SÃO PAULO. Silvio José Pereira, aos 44 anos, é um ho mem atormentado. Conta que devolveu o Land Rover de R$ 73 mil que ganhou de um empresário que tinha contratos com a Petrobras e que está arrependido de ter aceitado “o presente”. Mas ficou isolado. Vive entre São Paulo, onde tem um apartamento, e Ilhabela, na casa de praia. Sociólogo, disse que não consegue mais trabalho.

Passa a maior parte do tempo lendo relatórios das CPIs e documentos do partido. — O que me mata é não poder trabalhar. Virei um cara do bando dos 40. Como é que vou arrumar um emprego? — diz, referindo-se aos 40 denunciados ao Supremo Tribunal Federal pelo procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, no escândalo do mensalão .

Filho de uma empregada doméstica e um balconista, cresceu no meio das festas de São João de Carmo do Rio Claro, no sudoeste de Minas. Na adolescência, sua família se mudou para Osasco, na Grande São Paulo, e montou um bar, que ainda pertence aos Pereira.

— Se a coisa apertar, volto para o velho balcão do bar da minha família, não tenho problema com isso — diz. Aos 19 anos, Silvinho, como é conhecido, adotou o ideário socialista. Ajudou a construir o PT. creditava na revolução. Tomou parte na formação da tendência Hora da Verdade, que defendia a ruptura com o capitalismo e tentou evitar o pragmatismo político.

Mas suas idéias foram derrotadas, a tendência acabou extinta no PT e ele aderiu ao Campo Majoritário, que dominou o PT por 11 anos. Foi transformado em "quadro" de confiança do ex-presidente do partido José Dirceu. Desde então, Silvinho mudou. Com o PT no poder, recebeu a atribuição de cuidar dos cargos da base aliada.

Ganhou projeção. Passou a ser abordado por líderes políticos do país:— Eu continuo acreditando no socialismo. Mas mais nos valores políticos e ideológicos, não no modelo. No ano passado, foi revelado o caso que ele chama de seu único "grande erro", o Land Rover que ganhou de presente e devolveu depois de descoberto. Desde 1994, tem um apartamento de dois quartos no bairro Bela Vista, de classe média, que vale cerca de R$ 200 mil, uma casa em Ilha-bela, de R$ 400 mil, um carro e dois terrenos. As decla- rações de Imposto de Renda mostradas por ele à repórter não revelam evolução patrimonial.

Sonha agora em montar um restaurante e uma pousada em Ilhabela, mas acha que não terá freguesia enquanto o escândalo não for esquecido. Segundo ele, tem vivido de uma pequena poupança e da ajuda dos irmãos:— Tenho cortado gastos.

Tem muita gente importante envolvida nisso’ Silvio disse temer repercussão da entrevista e chegou a pedir para não publicar: ‘Vão me matar. Eles vão me matar’ Soraya Aggege.

Depois de um total de oito horas de entrevistas, divididas em dois dias, o ex-secretário-geral do PT Silvio Pereira chegou a pedir que o conteúdo das conversas não fosse publicado, dando a entender que está sob muita pressão e que acredita que correria “risco de vida”.

Disse que não tem estrutura financeira sequer para se sustentar e que também prometeu à família que não falaria com a imprensa. Contou que tem sido muito pressionado para se manter em silêncio e que suas revelações poderiam provocar nova crise política.

A repórter argumentou que não poderia omitir as informações obtidas, já que ele havia concordado com a publicação e feito revelações importantes. Silvio, então, ficou muito nervoso, ameaçou se matar e reteve em seu apartamento, no Centro de São Paulo, os documentos que havia entregado à jornalista, além de um dos cadernos de anotações da repórter.

Silvio foi procurado pela reportagem do GLOBO em sua casa na última quarta-feira à tarde. O objetivo era mostrar como vive o ex-secretário-geral do PT um ano após a crise do mensalão.

Ele recebeu a repórter e conversou por mais de três horas. Além de falar sobre sua vida, respondeu a diversas questões sobre o escândalo do mensalão, dizendo-se convencido de que as apurações não tinham sido profundas.Todas as questões foram anotadas.

Parte da entrevista foi gravada. Como tinha um compromisso à noite, o ex-secretário-geral do PT disse que ligaria no dia seguinte para marcar nova entrevista.

Na quinta-feira à tarde, Silvio ligou para a repórter e marcou um novo horário para a continuação da entrevista. As duas conversas aconteceram no apartamento do ex-secretário. Depois de mais de cinco horas de conversa, Silvio perguntou sobre o que seria publicado.

Ao ser informado da reprodução de toda a sua primeira entrevista, pontualmente, disse que a repórter fora fiel na reprodução e que o conteúdo era todo verdadeiro. Mas revelou em seguida ter medo das conseqüências:

"Vão me matar. Eles vão me matar, você não entende. Não faça isso comigo. Tem muita gente importante envolvida nisso" — repetia Silvio, com os olhos arregalados.

Diante das argumentações sobre a necessidade de sua versão ser divulgada, já que ainda há fatos do escândalo que continuam obscuros para a opinião pública, Silvio ficou ainda mais nervoso e passou a se bater e a destruir o próprio apartamento. A repórter deixou o apartamento e pediu ajuda a uma vizinha, que chamou o serviço de ambulâncias.

O porteiro do prédio, no entanto, entrou no apartamento e disse que ele já estava mais calmo, dispensando a ambulância. Queria apenas que a repórter fosse embora do prédio.

O porteiro recolheu no apartamento a bolsa da repórter que havia ficado sobre a mesa de Silvio, que ele jogou contra uma parede.

Um dos cadernos de anotações da repórter e vários documentos que a jornalista tinha recebido de Silvio não foram mais devolvidos. Na sex-ta-feira, o ex-secretário-geral deixou na portaria do seu prédio apenas o aparelho celular e o maço de cigarros da repórter que estavam junto com seu caderno e um recado de que iria viajar. As gravações e anotações feitas na véspera tinham ficado na redação do GLOBO.

Na entrevista ao GLOBO, o ex-secretário-geral do PT Silvio Pereira disse que não procurava empresários para arrecadar fundos para campanhas eleitorais e apontou quem mandava no partido: — Eu nunca me reuni com empresários.

A imprensa toda sabia o que eu fazia: levanta- mento de dados, análises dos palanques estaduais e nacionais, cruzamento de dados, análise política. Sempre fui da organização partidária. Quem mandava? Quem mandava eram Lula, (José) Genoino, (Aloizio) Mercadante e Zé Dirceu. Eu não estava à altura desse time.

Num domingo, segundo turno, eu cheguei no Zé Dirceu: ‘Zé, eu estou há 22 anos no PT e não vou me candidatar, não é a minha área. Quero ir para o governo’. E o Zé: ‘Não, você vai ter que ficar no partido’. Foi o meu primeiro não para o Zé.

"Mas eu sabia que meu destino estava selado. Mesmo assim, fui falar com o Lula, lá no IC (Instituto de Cidadania)".

Naquela época eu tinha uma velha mágoa no PT porque não me deixavam ser dirigente. O máximo era a Secretaria de Organização, e por mérito meu. Foi uma conversa de três horas com o Lula. É que com o Zé, o Zé... Nas veias do Zé Dirceu não corre sangue, corre política.

Depois de muito papo eu falei: ‘Lula, minha vida toda foi o PT. Agora eu quero um cargo (no governo)’. O Lula respondeu: ‘Fica tranqüilo. Nem sempre o time que começa é o time que termina’. E depois emendou: ‘Fica tranqüilo, eu não vou deixar meus amigos na mão’. Mas eu continuava carregando o piano.

Eu queria a secretaria geral, mas o Delúbio quis o (Jorge) Bittar. O Delúbio não me queria. Depois eu entendi por que ele não queria. Hoje gosto muito do Delúbio. Mas era uma disputa constante entre mim e Delúbio. E o Genoino fechava sempre com ele. Então eu fiquei no GTE (Grupo de Trabalho Eleitoral), e me deram um orçamento de R$ 600 mil. Duda Mendonça era com ele. E eu fui contra ajudar prefeituras (nas campanhas eleitorais de petistas para prefeito).”

Os maiores com Gushiken “Para os cargos foi criada uma comissão: Genoino, Delúbio e eu. Só não mexi com os fundos de pensão.

Os fundos ficaram por conta do (Marcelo) Sereno e do Delúbio. Os maiores ficaram com o Gushiken. Mas não houve nada de errado com os fundos. Com os cargos, eu tentava cumprir os acordos do partido. Mas o governo não cumpria, não funcionava. Mesmo com o Roberto Jefferson. Eu ia sempre lá para tentar fazer os ajustes. Tinha um Descontentamento muito grande do PTB.

Os ministros bloqueavam. O PT teve mil novecentos e poucos cargos. Não teve, por exemplo, no Ministério da Justiça, na Fazenda, nem no Banco do Brasil. Um dia eu fui lá falar com o Casseb (Cássio Casseb, ex-presidente do BB) e entendi. Ele me disse: ‘Poxa, Silvio, mas parece que tem dois PTs nessa história’. Olha, essa história de cargos foi uma grande ilusão. E o Lula me indicou formalmente para cuidar dos cargos.

Mas os partidos reivindicavam os cargos e eu ia lá convencer os ministros. Olha, eu só ajudei esses caras, como o Roberto Jefferson. Não acreditei quando ele falou de mim.

“Em 2004 me colocaram para escanteio. Veio a campanha e eu era do GTE e da secretaria geral. Em 2004, não estive com Lula, fiquei para escanteio. E começaram as divergências.” Cada vez mais gastos “Fui contra o partido contratar o Ibope e o Vox Populi para fazer as pesquisas (internas). Veja só: como fazer pesquisas estratégicas com duas instituições de grife?

Eu defendi a Fundação Perseu Abramo (ligada ao próprio PT), que ficou escanteada. Mas não me deixaram cuidar das pesquisas nem das relações com o Duda Mendonça. Então eu fui para o fundo do país, Norte e Nordeste, estruturando o PT. Eu queria uma nova geração de petistas.

Fiz um estudo, que acabou implantado. Dividi o país em 430 regiões, cada uma com 15, 20 cidades. Eram 2.500 diretórios em menos de 70% do país. O PT tinha um milhão de filiações cartoriais. E 80% dos municípios têm 15 mil eleitores, que no total são 33 milhões.

Assim, montamos o PT. O diretório nacional passava R$ 1.200 para cada microrregião, mais os outros diretórios, dava R$ 1.800 por mês para cada microrregião. Mas funcionou três meses, Delúbio não liberava mais dinheiro.

Eu não queria comitês efêmeros, de campanha, mas para durar. Por isso chamei coordenadores profissionais, remunerados, pus computadores. Por isso o projeto de informática. Mas aí a informática foi para a Secretaria de Organização e, enfim, chegou um ponto em que eu cansei. Cansei, sabe?”

“Veio Duda. Aquilo nos afundou” Veio o Duda Mendonça, um projeto de pool para 30 cidades, que não seria enlatado (a produção). Eram três pólos: São Paulo, Brasília e Recife. Aí veio a minha briga com o Genoino.

Um dia, soube pela Zilmar (Fernandes, sócia de Duda), em Brasília. Ela disse: ‘Nós faremos cinco capitais se o DN (diretório nacional) avalizar’. Soube por ela que os planos tinham mudado. E foram cinco: São Paulo, Curitiba, Belo Horizonte, Goiânia e Recife. Uma loucura, o partido não podia assumir aquilo (em termos financeiros).

Eu não me lembro dos valores. Mas aquilo nos afundou. Até porque, para a militância se aproximar, a gente teve que fazer campanhas paralelas, uma loucura.”

As dívidas crescem “2004 não foi um ano de bonança para o PT. As dívidas são o seguinte: em 2002, ficaram R$ 17 milhões de dívidas do DN, contando as campanhas de Lula, de Genoino (governo do estado de São Paulo) e de Mercadante (Senado). Dos R$ 17 milhões, pagamos R$ 14 milhões. Ficaram faltando R$ 3 milhões, da campanha para o Senado.

Aí veio a dívida dos estados: R$ 32 milhões. Sempre fui contra pagar essa conta. Conheço campanha, geralmente 70% são exageros, fantasias. Mas o DN assumiu. Ou seja: a dívida de 2002 foi de R$ 50 milhões. E toda a executiva topou.

Chega 2003. E aí, vamos pagar a conta? Pagar? Não, não. (Em vez disso) contrataram Vox Populi, Ibope, (compraram pesquisas) computadores etc. e tal. No fim do ano de 2003, a dívida era de R$ 120 milhões.

Aí veio a campanha de 2004. E como eu soube da conta? Marcos Valério entra na minha sala e mostra a conta. Ele não conseguia chegar no Zé (já ministro da Casa Civil). Ele então me mostrou a dívida. E todos imaginavam que a conta era de R$ 50 milhões ainda.”

O poder de Valério se tornou tão grande que o próprio tesoureiro, Delúbio Soares, perdeu o controle da situação, segundo Silvio. Valério passou a ter contatos diretos com políticos petistas e não-petistas.

No relato dele, os saques feitos no Banco Rural não foram autorizados pelo então tesoureiro do PT, Delúbio Soares. Teriam sido acordos entre parlamentares e o empresário com toda a sua enorme rede de lobbies.

Segundo Silvio, o plano dos petistas seria ajudar as campanhas municipais de candidatos aliados em 2004 e cobrir as dívidas de R$ 32 milhões dos aliados nos estados em 2002. A dívida que restou do diretório nacional (com as campanhas para a Presidência e o Senado) teria sido de R$ 3 milhões, disse. No entanto, em vez de se preocupar em pagar as contas anteriores, já no poder federal, em 2004 a direção do PT optou por deixar Valério cobrir as dívidas e ainda financiar as campanhas eleitorais em cinco capitais, mais a campanha do PTB, e ainda implantar projetos para ampliação do partido.

Silvio disse ainda que nenhum petista ficou com dinheiro para enriquecimento pessoal. E admitiu que foi um erro aceitar o Land Rover de presente do empresário César Roberto Santos Oliveira, da GDK, que presta serviços à Petrobras. Os principais trechos da entrevista:

Marcos Valério e seus interesses no governo “Foi o Virgílio Guimarães (PT-MG) quem apresentou Marcos Valério ao Delúbio. Em 1998 ele operava para o PSDB. Marcos Va- lério é um homem muito, muito inteligente. Ele atuou na campanha do Lula (em 2002) na normalidade. Depois foi crescendo. Ele tinha quatro pontos de interesse com o go- verno. Não se esqueça que ele vem do Banco Central, foi funcionário de lá. Por que você acha que acharam ele 17 vezes acionando o BC? Não tem essa história de propaganda, isso é bobagem.

O plano era faturar R$ 1 bilhão. Eles iam ganhar R$ 1 bilhão. Em quatro áreas: Banco Econômico, Banco Mercantil de Pernambuco e Opportunity. Tinha ações dele lá que renderiam dinheiro. Mas nenhum dos quatro esquemas rolava. Valério trabalhou com o Dantas (Daniel Dantas), mas o governo era dividido com essa história.

O quarto ponto eu não sei bem, mas eram uns passivos na área de agropecuária. Mas não deu certo, o BC não acertou as coisas para ele.” Encontro com a cúpula do PT depois do escândalo “O PT virou refém do Marcos Valério, não tinha mais jeito.

O Marcos Valério estabeleceu canais próprios com petistas e com não-petistas. Tem muita gente, muitos partidos (estão envolvidos). Só que tudo caiu na nossa conta. Não tinha jeito de ser diferente. Quando estourou (o escândalo), nos encontramos com ele. Marcos Valério disse três coisas: ‘Olha, tenho três opções: entregar todo mundo e derrubar a República, ficar quieto e acabar como o PC Farias, ou o meio termo’. Foi isso.”

arrecadado por Valério “Empresas. Muitas. Não vou falar nomes. As empresas entre si fraudam as coisas. Às vezes o governo não persegue, e é só isso. Elas se associam em consórcios, combinam como vencer (licitações).

O Delúbio começou a usar o Marcos Valério para pagar as contas. Agora, da lista do Banco Rural, o Delúbio não sabia, não. O que aconteceu é que o Delúbio perdeu o controle. Ele só sabia de três ou quatro deputados do PT. O resto, que recebeu no Banco Rural, não era esquema do Delúbio. Tudo o que foi sacado não tinha a ver com o Delúbio. Quem mais sacou? Há muita hipocrisia.”

A distribuição dos cargos para petistas e aliados “Quando assumi os cargos, fui muito abordado. Ganhei uma dimensão que não tinha, trânsito com todo mundo. Essa gente não é fácil, tentou tudo. Mas eu não ia a festas com eles. Por isso nunca vão provar nada, porque nada fiz de errado.

Meu papel era convencer os ministros do PT a liberarem cargos para os aliados. Porque tenho palavra. Quando o PMDB veio, em abril, e já estava tudo ocupado no governo, fiquei com o abacaxi. E muitos da base aliada de fato não entraram por questão ética, os ministros do PT são sérios.

Não me conformo de o PT pagar todo o pato. Se investigassem a fundo realmente, veriam isso. E o governo nada fez de errado. Mas não há interesse porque quase todo mundo está envolvido. Foi uma grande mística (a distribuição dos cargos).

De 7.900 pessoas que se inscreveram no sistema que eu montei, para toda a base aliada, com cargos e perfis técnicos, ficaram mais de 90% de fora. Foi um sistema legítimo. Cada deputado da base queria um cargo (federal) nos estados. Tinha ainda que dar uma cesta para o PMDB. Seriam 50 cargos.

Mas em 2004 atuei só no rescaldo disso. Roberto Jefferson inventou que eu era o gerente dos cargos em 2004.” “É um mecanismo que continua no país” “A verdade do PT não tem como ser digerida pela mídia. Como o Delúbio consegue, com uma assinatura dele mesmo, R$ 50 milhões? Olha, eu acho que o Delúbio não parou e olhou a coisa como um todo. Ele não é corrupto. Não é. Quem decidia tudo isso? Não havia uma decisão, não é como vocês pensam. Atrás do Marcos Valério deve haver cem Marcos Valérios. É um mecanismo, e que agora continua no país.”

“É mentira (sobre as malas de dinheiro denunciadas por Roberto Jefferson). Não houve nenhuma mala de dinheiro. O dinheiro não passava pelo PT. Era um esquema cômodo. Nem traficante usa mais mala de dinheiro. Isso é Al Capone. Agora, o PT deu muito dinheiro ao PTB.”

Acusações e o esquema nos Correios “Cadê a Skymaster? Cadê as minhas empresas que os jornais falaram? Disseram até que a HHP era minha. Estive uma vez apenas na Sky, a pedido de um líder da base aliada, cujo nome eu vou preservar, porque segundo ele a empresa estaria sendo prejudicada pelo governo. Fui ouvir e não fiz acordo. Nos Correios, quem operava de fato era o PMDB. Eduardo Medeiros não foi indicado por mim.” Tentou falar, mas o PT preferiu não ouvir “Se a direção do PT me chamar para ser ouvido, eu vou. Por que não me chamam?

Eu liguei para o Berzoini e disse a ele que gostaria muito de ser ouvido para que minhas informações ajudassem nas investigações internas. Eu disse a ele e repito agora: estou à disposição. E à disposição mesmo. Inclusive se quiserem fazer um depoimento aberto à imprensa. Ou sob sigilo, gravado, eu falo. Mas coloco só uma condição: que avaliem a postura de quem recebeu. Aliás, quem recebeu? Sabe qual é o problema? Eu nunca fui ouvido pelo PT. Nunca quiseram saber. Mas deveriam. Ou talvez saibam.”

Submetido nos últimos 12 meses à “lei do silêncio” imposta pelo PT, o ex-secretário-geral do partido Silvio Pereira rompeu o pacto e relatou, em duas conversas exclusivas com O GLOBO, na quarta e na quinta-feira passadas, o que ainda não havia contado sobre o esquema do valerioduto. Em seu apartamento no bairro Bela Vista, Centro de São Paulo, Silvio disse que tentou contar tudo à nova direção do PT e que telefonou para o presidente do partido, Ricardo Berzoini, se pondo à disposição. Não conseguiu ser ouvido. Um ano depois das primeiras denúncias de corrupção nos Correios, que desaguaram no escândalo do valerioduto, o que Silvio conta são detalhes da operação comandada pelo empresário Marcos Valério e a antiga cúpula do PT, da qual fazia parte como secretário-geral, e também sobre o esquema de distribuição de cargos para petistas e aliados no governo, a operação da máquina do partido nas duas últimas eleições e sua visão sobre o envolvimento da cada personagem.

Segundo Silvio, o plano do empresário Marcos Valério com o PT era arrecadar o montante de R$ 1 bilhão, em quatro áreas, todas com pendências na atuação do governo: Banco Econômico, Banco Mercantil de Pernambuco e Opportunity, além de operações de passivos na área da agropecuária. As operações não teriam dado certo e por isso Valério teria passado a cobrar as faturas. O esquema foi investigado por duas CPIs (dos Correios e do Mensalão), pela Polícia Federal e pela Procuradoria Geral da República, que denunciou ao Supremo Tribunal Federal 40 autoridades, ex-autoridades e empresários envolvidos diretamente com a “sofisticada organização criminosa” que resultou na cassação dos mandatos de deputado de José Dirceu (PT-SP) e Roberto Jefferson (PTB-RJ) — o primeiro, o todo-poderoso chefe da Casa Civil do governo Lula por dois anos e meio e o segundo, o antigo aliado que denunciou o mensalão. Silvio afirma que existem outros partidos envolvidos e que “há cem Marcos Valérios por trás do Marcos Valério”, dizendo acreditar que o esquema todo pode ter voltado a funcionar, já que, apesar das CPIs, as estruturas de corrupção não foram modificadas.

Segundo Silvio Pereira, a fonte dos recursos que foram injetados no PT, principalmente para campanhas eleitorais do próprio partido e do PTB, nas eleições de 2004, é basicamente oriunda de um pool de empresas, empenhadas em ganhar contratos com o governo e também em garantir o destino de emendas de parlamentares. Bastaria o governo não notar os pools, principalmente em consórcios, disse. Na versão do ex-secretário-geral do PT, Marcos Valério funcionaria como um dos emissários da arrecadação ilegal junto a empresas de variados setores. Silvio contou ainda que foi feito um acordo com Marcos Valério logo depois de estourado o escândalo, que completa um ano este mês. A culpa ficaria mais centrada no PT e nos principais envolvidos. O empresário teria dito aos petistas que tinha três opções: contar tudo o que sabe e “derrubar a República”, por causa do envolvimento dos outros partidos, dos políticos e das empresas; calar-se e acabar assassinado como PC Farias (o tesoureiro do ex-presidente Collor); ou contar parcialmente o que sabe. — Mas não há santo nessa história toda, em nenhum partido, nem na direção do PT, quepagou o pato todo — diz.O ex-secretário-geral exime o presidente Luiz Inácio Lula da Silva de responsabilidade no esquema e afirma que em 2004, já ministro, o ex-presidente do PT José Dirceu não recebia Marcos Valério, nem gostava da situação. O empresário teria tido um comportamento normal na campanha de 2002, mas em 2004 passou a ter acesso irrestrito à direção nacional do PT. A maior parte dos dirigentes sabia da influência de Valério e das dívidas do partido com ele, que chegaram a R$ 120 milhões, segundo o ex-secretário.